Ironman Brasil 2011

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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Ciclistas - Ciclovia - Autoridades - Legislação



Programa da TV União que transmitiu excelente debate em 15.02.2012


Ontem, ao assistir o excelente programa A Verdade, veiculado pela TV União e conduzido pelo jornalista e corredor Hamilton Nogueira, fiquei pasmo ao ver o pocisionamento da autoridade responsável pela Companhia de Policiamento Rodoviário - CPRV sobre os ciclistas na rodovia CE-040.

Antes, temos que nos localizar no debate. O programa visava discutir a cidadania e o trânsito, abordando, também, a problemática dos ciclistas que utilizam a Av. Washington Soares e a CE-040 frente os inúmeros acidentes que vem ocorrendo naquela região, envolvendo ciclistas e condutores de veículos automotor (geralmente embriagados).

Pois bem! Ocorre que o Coronel Studart, a autoridade mencionada acima, inobstante sua boa vontade em solucionar o problema, afirmou que, se o condutor embriagado está errado, o ciclista que trafega fora da ciclovia também o está. E foi exatamente ao ouvir esta afirmação que pasmei.

NÃO É BEM ASSIM!

Vamos por partes! O Código de Trânsito Brasileiro - CTB, Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, em seu art. 58, assim versa:

  • "Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores."

É com base no dispositivo legal acima que o Cel. Studart ampara sua afirmativa. À primeira vista, numa análise superficial, parece estar correto. Afinal, o artigo fala que a circulação nos bordos da pista de rolamento só pode ocorrer com a seguinte condicionante: quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes.

Mas, como já disse acima, NÃO É BEM ASSIM! O Cel. Studart está PARCIALMENTE correto.

Neste caso ora analisado, há de se perceber que há ciclistas e ciclistas. Parece-me óbvio que o CTB fez menção ao ciclista comum, ou seja, aquele que utiliza sua bicicleta apenas para se locomover. A interpretação do art. 58, feita pelo Coronel Studart, é perfeita para este tipo de ciclista. Há a ciclovia? Há. Então este ciclista não pode trafegar no bordo da pista de rolamento da Av. Washington Soares e na CE-040. Perfeito!!

No entanto, o ciclista esportivo não é um ciclista comum. Trafegamos a velocidades relativamente altas para uma bicicleta. Velocidade esta que pode chegar a mais de 60km/h. Muitas vezes, treinos são realizados com médias de 40km/h. E é aqui que salta a pergunta: Como podemos, praticando o ciclismo esportivo, trafegar na ciclovia da av. Washington Soares e CE-040? E eu mesmo respondo: IMPOSSÍVEL!!! Ressalte-se que o pára-choques do ciclista é sua própria testa!!

A lei não consegue esgotar todas as situações da vida. Ou seja, não há como o legislador abarcar todas as possibilidades no texto legal. Sempre aconterão fatos que não estarão literalmente previstos na legislação. Mas, nem por isso, deixarão de estar amparados pelo ordenamento jurídico. Para resolver tais problemas lança-se mão das técnicas de interpretação da lei. A hermenêutica jurídica é a técnica específica que visa a compreender a aplicabilidade de um texto legal.

E é aqui que a Administração Pública, no nosso caso específico, a autoridade de trânsito responsável pela Av. Washington Soares e CE-040, a saber, a CPRV, deve, SEMPRE MOVIDA PELO INTERESSE PÚBLICO, interpretar a legislação da melhor forma, compatibilizando interesses.

Parece-me que, diante do art. 58 do CTB, há de se usar interpretação teleológica. Segundo a Teoria Geral do Direito, é a técnica que objetiva adaptar a finalidade da norma às novas exigências sociais. Tal técnica busca no preceito normativo a sua finalidade, para então determinar o seu sentido. Para tanto, do topo de tal ordenamento, munido do conhecimento dos fins para os quais foram elaborados, deverá atentar para todo o panorama social hodierno visando adaptar o seu sentido.

Assim, vê-se, POR ÓBVIO, que o ciclista atleta não pode usar a ciclovia na forma em que hoje ela existe, a saber, cheia de obstáculos e interrupções. E então? Eu, ciclista atleta, ao usar o bordo da pista de rolamento estarei errado, comentendo uma infração administrativa? Caso a resposta seja positiva, como pretende o Cel. Studart, eu ficarei tolhido de praticar meu treinamento. Entretanto, o próprio art. 58 do CTB, ao mencionar as condicionantes para uso do bordo da pista de rolamento, diz: "(...) quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes (...)".

Ora, é claro que, para o ciclista atleta, NÃO É POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO DA CICLOVIA existente hoje na Av. Washington Soares e CE-040. Assim, consequentemente, abre-se a possibilidade de trafegar no bordo da pista de rolamento. TUDO PERFEITAMENTE EM CONSONÂNCIA COM O ORDENAMENTO JURÍDICO.

Destarte, NÃO... não estão comentendo infração administrativa os ciclistas atletas, EM TREINAMENTO (é bom que seja reforçado), que estejam trafegando no bordo da pista de rolamento da CE-040.

É, na minha humilde visão, a melhor e mais justa interpretação da norma.

Não podemos fazer uma interpretação que restrinja o direito de um grupo, no caso, os ciclistas. Nós só queremos segurança, frente as barbaridades que motoristas alccolizados vem praticando diuturnamente. Não se pretende ser melhor ou pior do que os outros interesses. Só pretendemos receber o que nos é de direito. Queremos praticar nossos treinos com a segurança que se espera do Estado. É sabido de todo o problema social e cultural vivenciado. Mas é exatamente neste contexto que o Estado, na sua posição de mais forte, e em nome do interesse público, deve agir.

Eis o meu pensamento, salvo melhor juízo!

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